domingo, fevereiro 05, 2006

Espanha, Madrid - 24 a 27 de Janeiro 2006

Não quis deixar de registar a minha passagem pela capital espanhola, embora guarde para mais tarde um testemunho de mais uma viagem, ficando desde já a promessa de voltar ao blog para escrever sobre Madrid.

Moçambique - 27 de Dezembro a 07 de Janeiro 2005/06

Após um ano de intenso trabalho e das curtas férias na Escócia, rumei a África, deixando para trás o trabalhoso ano 2005 e iniciando tranquilamente o ano 2006.

Já tinha estado neste continente por diversas vezes, inclusivamente na África Negra, como é o caso do Quénia e da Tanzânia. Contudo, permanecia por conhecer uma das mais belas ex-colónias portuguesas, assim como a África do Sul.

O voo directo a Maputo dá-nos uma estranha sensação de conforto, após tantas outras viagens via Frankfurt, Londres, Madrid, Paris ou qualquer outro hub europeu.

Levava comigo as memórias de imagens e experiências de outras paragens africanas, os tristes relatos e opiniões, que televisões e jornais nos inundam diariamente. Ia preparado para o pior... um país carenciado, com problemas sociais, de logística e uma economia extremamente débil.

Esperava também um trânsito caótico e altos índices de poluição, um pouco influenciado pela recordação de duas cidades não muito distantes: Nairobi ou Arusha.

Aterrei finalmente no Aeroporto Internacional de Maputo e após mais de hora e meia entre o controlo de passaportes e a recolha de bagagens, saí à rua, onde aguardava o autocarro para me levar ao hotel, no centro da capital moçambicana.

Observo atentamente os arredores da cidade e começo por confirmar todo aquele turbilhão de informação... amontoados de chapa, que servem de casas eternamente temporárias, de construção artesanal, lixo acumulado nas ruas semi-esburacadas e passeios de terra batida e avermelhada pelo efeito dos minerais.



Na berma da estrada encontrei pequenas bancas de venda de quinquilharias, tubos de escape e... imagine-se, pedras da calçada. Nunca me passaria pela cabeça que vender pedras avulso pudesse ser um bom negócio. «Bem vindo uma vez mais a África» - pensei.

Poucos minutos depois, o autocarro rompe pela cidade de Maputo. Aos poucos e poucos, aquela ideia de uma cidade tipicamente africana desvanece, dando lugar a agradáveis surpresas, que se sucedem a cada metro percorrido.

As acácias rubras dão um colorido imenso às largas avenidas, onde o trânsito se desenvolve com surpreendente normalidade e sentido cívico. A calma e tranquilidade da cidade convida-nos a um inesperado passeio pelas suas ruas. Não cedi de imediato à tentação e parti antes para uma visita de reconhecimento de mini-bus.



As ruas permanecem com a mesma traça ortogonal deixada pelos portugueses, pontualmente interrompida por linhas mais assimétricas e sinuosas. Os edifícios inspirados na arquitectura civil do antigo regime, acentuam a identidade com Portugal e permanecem integrados - embora alguns dotados ao abandono.

Vou passando por alguns mais mediáticos como é o caso da Rádio Moçambique, o Antigo Museu Salazar (Hoje Samora Machel) ou a Vila Algarve (antiga sede da PIDE em Maputo). Mais parece um autêntico passeio pelas avenidas novas de Lisboa, tal a semelhança do estilo arquitectónico, onde nem falta a esfera armilar manuelina, que ornamenta e encima os edifícios.

A Av. Julius Nyerereou, onde se encontra o belo Hotel Polana, em estilo colonial (datado de 1922), é provavelmente uma das mais bonitas das cidade, povoada em grande parte por embaixadas e moradias luxuosas, que nos fazem recordar o Restelo, em Lisboa. Uma vez mais as acácias harmonizam o espaço e ajudam a marcar o contraste entre o tom avermelhado da terra batida e a verdejante relva, de nítida influência inglesa, através da vizinha África do Sul.



Na verdade, começam a notar-se os investimentos sul-africanos, talvez mais que os portugueses, que se entregaram à hotelaria e restauração. As maiores cadeias de super-mercados e centros comerciais são sul-africanas e na estrada conduz-se pela esquerda...

Ainda assim a cidade conserva os seus monumentos mais emblemáticos, que lhe conferem alguma identidade nacional e genuína, como é o caso da fantástica Estação dos Caminhos de Ferro de Moçambique, em estilo colonial, tal como a entrada principal do Mercado Municipal ou a Fortaleza de Nª Senhora da Conceição (actualmente museu militar). Curiosa também a Casa de Ferro, projectada por Gustave Eiffel e trazida da exposição universal de Paris.



A baixa da cidade, a par do bairro das embaixadas, é indubitavelmente o local mas significativo e interessante da cidade. É também aqui que se encontra o Jardim Botânico, em frente do qual se ergue uma estátua de Samora Machel. Não muito distantes, um edifício em estilo neo-clássico, em excelente estado de conservação, e uma imponente igreja (réplica da existente na Av. da Igreja, em Lisboa), às portas da qual passava uma banda que animava uma festa de casamento recém celebrado.



Tomei a direcção do mar, passando pelo mercado do peixe (onde se vende a pesca ainda viva), seguindo depois para a Costa do Sol, ao longo da baía de Maputo (antiga Baía Espírito Santo). Ao largo, avistam-se as ilhas. Para trás ficaram o Clube Naval e o Clube Náutico, que continuam a ser uma referência para os portugueses residentes.

A zona costeira é desprovida de grandes edifícios. As praias conservam o seu estado natural e convidam à brincadeira das crianças, que chapinham em cuecas na rebentação das ondas sobre o curto areal.

Na costa do sol encontra-se um dos melhores restaurantes onde comi em Moçambique. Do outro lado da estrada, o comércio de artesanato prolonga-se pelo parque de estacionamento, até à beira da praia.



Deixei a cidade, partindo para o Kruger Park, na África do Sul. De Maputo até lá são apenas duas horas de carro, assim os procedimentos alfandegários sejam céleres.

Passo uma vez mais pelos vendedores de quinquilharias, escapes e pedras da calçada, nos arredores da cidade e tomo a direcção Oeste. A estrada, financiada pelo governo sul-africano, é uma recta contínua e bem pavimentada, que nos conduz à Fronteira Rassano Garcia.

O que encontramos nos arredores de Maputo pouco ou nada tem que ver com a bela cidade colonial. A pobreza é uma evidência, como atesta o enorme conjunto de favelas de adobe, colmo e chapas de metal, morada de várias centenas de famílias refugiadas, do período da guerra civil. Um panorama bem mais à medida da África que conhecia... e bem mais triste.

Mas a exuberância da natureza no seu estado mais puro prevalece poucos minutos depois, estendendo-se até quase à fronteira, onde voltamos a constatar o movimento dos refugiados, com o novo aglomerado de barracas.

Neste período do ano, a raia moçambicana está particularmente movimentada com a azáfama provocada pelos inúmeros camiões e carros de transporte de mercadorias, turistas e regresso de trabalhadores ao seu país natal.

Por momentos pensei que ia ficar ali o resto do dia... bem mais que as 2 horas que a estrada exigia... Mas o motorista resolveu a questão com uma nota no passaporte e 15 a 20 minutos depois tinha mais um carimbo. Mais alguns metros e chegamos à fronteira sul-africana. Ligeiramente mais organizada, mas não muito...

Finalmente entro na África do Sul. A paisagem não é muito diferente, apenas não se nota o movimento dos refugiados, estando um pouco mais humanizada, em particular no desenvolvimento agrícola (extensas plantações de bananeiras)... em tudo o resto se assemelha a Moçambique.



Ainda antes de chegar ao Kruger Park, é possível admirar espantosas formações rochosas em granito, com mais de 300 milhões de anos, que aqui permanecem intactas desde a expansao e fragmentação da Pangeia.

É curioso e até irónico constatar que grande parte do território da potência regional sul-africana depende do fornecimento energético moçambicano, com o evidente contributo do legado português em Cabora Bassa.

A mata torna-se mais densa à medida que nos aproximamos do Kruger Park. As expectativas são necessariamente elevadas, quando se trata de visitar uma das reservas mais famosas do mundo.

O parque hoteleiro desenvolve-se ao longo do rio, no limite do Kruger Park, estabelecendo a fronteira entre o urbano e o selvagem.



Os primeiros safaris (nocturno e matinal) foram desoladores para quem já tinha estado em Masai Mara, em Serengeti, na fantástica cratera de Ngoron Ngoro ou no Lago Manyara, e havia observado milhares de animais que mais pareciam autênticas manchas gigantes, tal era a dimensão das manadas, ou os big five (leão, leopardo, rinoceronte, búfalo e elefante) em poucas horas, ao ponto de dispensar fotos aos incontáveis grupos de gnus, zebras, impalas e gazelas...

Um rinoceronte, alguns impalas, umas quantas girafas e algumas aves (rei pescador, calaus, aves de rapina...) era o balanço das primeiras visitas no Kruger.



Ainda que a minha visita decorresse já na época das chuvas, custava a acreditar em tamanha ausência de espécies... Por muito que o frio convidasse a ficar na toca, na protecção dos arbustos ou nos inacessíveis rochedos; Por mais que a água agora abundasse em todo o parque e evitasse as clássicas emboscadas dos felinos junto aos lagos e rios; Nada parecia deter a desilusão dos inúmeros turistas!

Contudo, o sol rompeu as nuvens mais negras, a temperatura subiu e a tarde tornou-se amena e bastante mais convidativa. É impressionante como a Natureza pode mudar em poucas horas! Num ápice surgiram os animais. Manadas de zebras, gnus, impalas e gazelas, famílias de girafas, cudos, babuínos, cobras pitão, tartarugas, lagartos, caracóis gigantes, marias-café, calaus, águias, abutres e até alguns dos big five: búfalos, elefantes e rinocerontes.





Mas a tarde não acabaria sem um dos momentos mais intensos da minha passagem pelo Kruger Park... um belíssimo exemplar de leopardo, deitado sobre um tronco seco, a contemplar a paisagem. Ao ruído do motor e da travagem do jipe, rapidamente desapareceu na densidade dos arbustos. Foram alguns segundos de deslumbramento... mas certamente muitos anos na memória, mesmo que sem um registo fotográfico para a avivar.

No regresso ao hotel, tempo ainda para observar 3 pequenas hienas que se amamentavam na progenitora, enquanto outras brincavam na vegetação restinga.



As expectativas criadas para o dia seguinte eram necessariamente elevadas. Para completar inevitável lista dos big five faltava apenas avistar um leão.

Percorri o Kruger Park de Malelane Gate a Skukuza em busca do mais famoso dos felinos... pelo caminho fui encontrando tantos outros animais.

Finalmente, bem perto da hora do pico do sol, o inesperado... uma família de 20 leões, entre adultos e crias, que descansavam na sobra da copa das árvores.

Por breves segundo apenas, uma vez que repentinamente um casal de javalis irrompeu descuidadamente pela mata, dando início a uma feroz perseguição das leoas adultas, que presentearam a família com um inesperado banquete.

A tarde evoluiu em ritmo de passeio. Pouco mais havia para ver. Uma última passagem pela toca das hienas com crias e pelas manadas de zebras, seguida do regresso ao hotel para saborear as mais recentes aventuras.



Na madrugada seguinte regressei a Maputo, sem qualquer percalço na fronteira, bastante mais fluida que há alguns dias atrás. Parti nesse mesmo dia para Bazaruto, numa pequena avioneta. A vista aérea entre Inhambane e o Arquipélago de Bazaruto é simplesmente de sonho. Os azuis e verdes do mar misturam-se com o tom claro das bossas de areia e pequenos ilhéus, que compõem uma paisagem deslumbrante.

Já sobrevoei diversos outros arquipélagos do mundo, dos Açores às ilhas gregas, de Cabo Verde às Caraíbas e Brasil, das Maurícias e Seychelles às Maldivas, mas nenhum destes envergonha o arquipélago de Bazaruto!



O arquipélago é constituído por apenas 4 ilhas, sendo a Ilha de Bazaruto a maior e a única a ser habitada. Ainda assim, não existem povoados... Apenas casas desgarradas de pescadores, junto aos hotéis, dada baixíssima a densidade populacional da ilha. Diria mesmo que pouco mais de 100 nativos e trabalhadores habitam em Bazaruto.

O lado Este da ilha é surpreendentemente dominado por gigantescas dunas, como se de um autêntico deserto se tratasse, pontualmente interrompido por lagos naturais, um dos quais povoado por crocodilos, mas todos eles pontilhados de branco, cinza e outras cores, pelas mais de 160 espécies de aves, que nidificam na Reserva Natural do Arquipélago de Bazaruto.



A ilha conta com apenas dois hotéis: o Indigo Bay (mais requintado e a Sudoeste) e o Pestana Bazaruto (mais informal e a Norte), embora qualquer um deles acima da média. Cada hotel tem o seu próprio aeródromo, garantido um nível de exclusividade e conforto levado ao extremo.

Fiquei alojado no primeiro, tendo no entanto visitado a unidade portuguesa, onde acabei por encontrar o Principe Harry de Inglaterra, com a sua namorada e os primos, que ali ficaram alojados por pouco mais de 15 dias.

Apesar de não muito distantes, numa linha recta virtual, os dois hotéis ficam a sensivelmente 30/45 minutos de jipe, em consequência do relevo acidentado e do divertido traçado ao longo da praia e da estrada de terra batida, que serpenteia a ilha entre norte e sul, este e oeste, sem qualquer rigor ou planeamento.



A baia de Indigo, que dá o nome ao hotel, desenvolve-se ao longo de alguns kms de praia, banhada por tépidas águas cristalinas e protegida por barreiras de corais fósseis, que lhe asseguram uma tranquila piscina natural.

A praia é praticamente deserta, apenas frequentada pelos hóspedes do Indigo Bay Resort e pelos poucos pescadores nativos, que garantem marisco e peixe fresquíssimo ao hotel. As tardes de praia e na piscina virada ao mar deixam saudades a qualquer um...



Outros locais de destaque na ilha são as praias da encosta leste de Bazaruto, protegidas pelas gigantescas dunas. Na extremidade norte fica a baia dos golfinhos, um ponto de paragem obrigatório para banhos. Quando a maré está baixa, é possível percorrer toda a costa leste da ilha, pela infindável praia... deserta de pessoas mas repleta de aves marinhas.